O nome da cuba de madeira era cabungo. O recolhedor, como bem disse o Magrowski, era o cabungueiro, profissão que certamente tinha um "status" inferior à dos lixeiros, embora prestasse um serviço fundamental numa época em que as casas não eram ligadas à rede de esgotos. A rede de esgotos de Rio Grande começou a ser instalada, se não estou enganado, lá por 1916/17. Como as ligações à rede foram ocorrendo paulatinamente, a profissão de cabungueiro deve ter durado ainda algumas décadas. Nunca vi um cabungueiro. Como minhas recordações começam no início da década de 1950, suspeito que a profissão já estivesse desaparecida nesta época, a menos que ainda prestasse seus serviços em algum bairro periférico. Abração. Jair
Renato disse…
Cabungueiros e seus Cabungos I
Hoje a população não sabe, nunca ouviu falar e nem imagina o que foram os “cabungueiros” ou o que foi um “cabungo”
No fim do Império, no Rio de Janeiro havia os chamado tigres, escravos que carregava baldes e barris cheios de dejetos humano sobre seus ombros, que eram levados e jogados ao mar.
Excrementos de uma corte simplória, fedida e como o povo também mestiça seguida de pequena elite semianalfabeta, bajuladora e também fedida, que obrigavam homens escravizados a carregarem suas porcarias, pois não havia rede de esgoto.
Lembrando que o Rio de Janeiro, quando aqui chegou fugindo da Guerra de Napoleão a família real em 1808 fedia pior que uma carniça. Era um esgoto a céu aberto. Era uma cidade imunda, fedida e pestilenta.
Eram esses homens chamados de tigre, pois as porcarias humanas que escorriam desses recipiente deixavam em seus corpos famélicos listras de fezes, o que o levou a serem comparados a tigres.
Porém ainda no fim dos anos cinquenta, início dos sessenta do Século XX, nas cidades de Pelotas e Rio Grande o serviço continuava a todo vapor, agora feito por homens livres.
Havia nas regiões mais abastadas banheiros com louças ligadas a um esgoto cloacal arcaico que simplesmente levava as fezes humanas sem nenhum tratamento para os rios. Rios de onde sairiam a água de beber.
Nas regiões menos agraciadas, onde morava a esmagadora maioria da população, tanto nas cidades quanto no campo o que se usava era as latrinas.
Entretanto nas latrinas mais modernas, essas junto às cidades em bairros populosos, não havia o célebre e profundo buraco cheio de estrume humano e sim o histórico e valoroso “cabungo”, que na cidade portuária de Rio Grande era chamado de “cubo”.
O cabungo ou cubo era um pequeno barril cônico de madeira de aproximadamente cinquenta centímetros de altura, com a boca de mais ou menos vinte e cinco centímetros, chegando a sua base com trinta e cinco centímetros, que semanalmente era substituído pelo Asseio Público, que os levava em carroças puxadas por cavalos percherons, melhor alimentados que os pobres e desgraçados homens que tal serviço faziam.
Levavam o cheio e deixavam um limpinho, embebido em alcatrão ou óleo bem escuro misturado com um pouco de creolina.
Anos depois em Pelotas essa carroças foram substituídas por caminhões pequenos. Lembro-me de um Ford verde que atendia o fragata.
Tais barris eram feitos em tanoarias especializadas aos milhares para poder suprir a demanda de uma grande população, pois vilas e bairros inteiros eram assim atendidos.
Em Pelotas os chamados cabungueiros, homens que transportavam os cabungos, retirando os cheios de fezes e levando-os para as carroças, que depois de recolherem iam para as margens do canal de São Gonçalo, onde despejavam e lavavam esses barris bem próximo de onde atracava a balsa, no final da Rua Tiradentes que fazia a transposição de raros caminhões e automóveis de um lado para outro do canal, erradamente chamado de rio. Essa balsa era o meio que ligava Pelotas a isolada Rio Grande.
E todo esse trabalho imundo, fedido e altamente contaminante, onde vicejava as doenças era feito sem nenhum equipamento de proteção.
Descalços, mal alimentados, pessimamente remunerados, carregavam as sujeiras de toda uma população, com suas calças e camisas velhas cheias de remendos e de fezes. Cheios de doenças e de vermes que dilaceravam suas vidas, que por esse comprometimento eram velhos e alquebrados aos trinta e poucos anos.
Eram considerados por muitos como sendo a escória da humanidade, pois além das doenças que carregavam em seus corpos famélicos e valetudinários, cheiravam tão mal que as pessoas evitavam até de olhá-los, com medo de pegarem suas doenças e principalmente nojo.
Renato disse…
Cabungueiros e seus Cabungos II
Por onde passavam deixavam um rastro de mau cheiro e muitos cabungos, cheios até a boca, muitas vezes deixavam outro rastro nos pátios, por onde eram carregados. Um rastro das porcarias humana que como nenhum outro animal tem as mais fedidas fezes.
E assim mesmo, cheirando pior que qualquer outro animal, tem a extrema veleidade de se dizerem divinos, filho de um deus, com o poder por esse dado de reinar sobre os animais.
- Que hipocrisia.
- Que pretensão.
Pretensão que beira a demência.
Pobres cabungueiros.
Seres explorados vilmente em um trabalho sujo, duro e desumano, mas mesmo assim alguns eram gentis e gracejavam de seu próprio infortúnio.
Infortúnio cruel que os aniquilava. Outros sequer falavam, eram homens amargos, tristes, mas todos tinham o mesmo futuro, o de morrerem jovens ainda, mas de aparência extremamente velha, pálidos ou de um amarelão que dava medo. Vidas carcomidas, cheios de vermes que os corroíam em suas desgraçadas sagas.
Muitas vezes se estava usando a latrina, bem sentado no banquinho de madeira sobre o cabungo, quando de repente um funcionário do Asseio Publico abria a portinha dos fundos da latrina e trocava o valoroso barrilzinho, que era puxado por um ganho de ferro já munido de uma tosca tampa que nada tapava, sem ver quem estava sentado obrando.
Levava-se um enorme susto, mas a obra continuava agora em um cabungo limpinho e cheirando a óleo e creolina.
Prof. Pedro A.C. Teixeira Texto extraído do livro ainda sem título de minha autoria sobre minhas memórias que pretendo em breve editá-lo. (data:2012)
Cabungos Meu falecido pai contava que por volta de 1945, quando moravam na Rheingantz, em frente ao hoje Hospital de Cardiologia, ali era eram um campo por onde as pessoas passavam para ir trabalhar na fábrica. Como a grana era curta naquela época, igual aos dias de hoje, os mais afoitos cobravam uma pequena taxa de quem enchia seus cabungos antes do tempo e faziam o especial favor aos moradores de se livrarem de duas fétidas caixas. No campo que ligava a Av. Primeiro de Maio à Av. Rheingantz havia uma trilha de areia por onde passavam os operários em meio do capinzal. À noite, eles se reuniam, abriam buracos, despejavam as cheirosas caixinhas e tapavam com uma espécie de rede feita do matagal e areia. Pela manhã ficavam na espera para ver quem caia no buraco. Ora eram homens, ora mulheres que, geralmente vinham duas ou três de braços dados e caiam juntas naquela massa fedida.
Anônimo disse…
Sobre os cabungueiros, consta que, em Pelotas, uma vez, chegou um cabungueiro, alcoolizado, invadindo o gabinete do prefeito (omito a propósito o nome), reclamando do serviço, com palavras bem grosseiras. A que se reportou o seu chefe de gabinete, sugerindo uma demissão sumária. Respondeu o prefeito: não, para fazer esse serviço, só bêbado mesmo, eu seria capaz de fazer. Esses eram assim como os lixeiros, aqueles que dever-se-iam chamar de limoeiros, aliás, LIMPEIROS.
Renato disse…
Pelo menos uma das coisas ditas acima pelo Prof. Pedro A.C. Teixeira pode ser facilmente vista e comprovada na foto enviada por João Reguffe : entre as patas dos cavalos os 'pés descalços' do trabalhador com cubos.
ARLINDO TEIXEIRA disse…
Esse serviço foi extinto somente entre final de 1963 e início de 1964.Tenho certeza disso pois foi quando meu pai comprou uma casa de madeira, a qual foi substituída por uma de alvenaria, na rua Caramuru,531 onde hoje ainda mora minha mãe. Logo que nos mudamos recebemos notificação da Prefeitura dizendo da suspensão do serviço e que providenciássemos a ligação na rede ali já existente. Para o restante das residências que ainda não fossem servidas com tal rede, teriam que se socorrer da construção de fossas. ABS
Vilmar Cadaval disse…
Concordo com o Arlindo, eu morava na Colombo 564 e, embora na minha quadra já contássemos com o serviço de esgotos, por ali transitavam os cabungueiros que, no início dos anos 60, ainda atendiam as transversais e praticamente toda a Cidade Nova.......quando vim para PAlegre, em janeiro/66, não fazia muito tempo que o serviço tinha sido extinto.
Sard@ disse…
Aqui no Cassino não havia cabungueiros eram pouquíssimas casas que possuíam fossa séptica, a maioria das casas utilizavam pequenas latrinas que eram trocadas de lugar periodicamente, ao invés de descarga era usado um balde de areia da praia para não juntar moscas, colocadas um pouco cada vez que era utilizado. Quando faltava meio metro para encher, o buraco era tapado com areia e era cavado outro, e a latrina ganhava outro espaço. Sempre tendo o cuidado de coloca-la o mais longe possível da bomba d'água! Atualmente aqui no Cassino 90% das casas tem água encanada, mas as fossas continuam.
Renato disse…
SATURNINO DE BRITO
Tem razão Arlindo e a nossa casa, Caramuru quase esquina de Bento Gonçalves, logo na outra quadra da do Arlindo e onde morei por mais de 15 anos, em 2002 e na mesma quadra, algumas casas ainda não contavam com esgoto e se socorriam de fossas e que eram construídas junto a um filtro anterior. Em um retorno por lá e pelo Google Street noto agora o "bolachão" existente na frente das casas, na calçada e próximo ao meio fio e que acredito seja da Corsan.
Em Rio Grande os estudos iniciaram a partir de 1909 sendo que em 1917 sob o comando do Prefeito Juvenal Miller encomenda ao renomado engenheiro sanitarista Saturnino de Brito o início das obras de rede de esgotos a qual deu por encerrada a base em zona central da cidade em 1922.
Saturnino de Brito, brilhante engenheiro reconhecido tanto na Europa como nos Estados Unidos e eleito Patrono da Engenharia Sanitária Brasileira foi agraciado em 1926 com a Legião de Honra na qualidade de 'savant et ami de la France'.
Nome de rua em nossa cidade, Saturnino de Brito (Francisco Saturnino Rodrigues de Brito) faleceu lá mesmo em Pelotas em 1929 enquanto administrava projeto semelhante ao que fizera em Rio Grande.
Renato disse…
Enquanto difícil encontrar relatos em nossa cidade, uma pesquisa na vizinha cidade de Pelotas e encontram-se estas 'relíquias':
“É exactamente ao meio dia, quando o calor se torna mais intenso, que os vehiculos da limpeza transitam pelas ruas da cidade fazendo a população supportar cheiros enauseabundos que alteram a saúde e tornam-se assas incommodativos”. (CORREIO MERCANTIL, 27.04.1876)
De 1884 a 1886 a taxa média anual de mortalidade foi de 26,6 para cada mil pessoas em decorrência principalmente de doenças relacionadas à falta de higiene. Em 1890, os jornais sugeriram que os serviços se tornassem obrigatórios, pois, dos 4.200 prédios existentes na cidade, apenas 1.000 eram assinantes do asseio. A imprensa afirmou: “
É claro, pois, que 3.200 casas que o não são, fazem os despejos nos quintaes, nos sumidouros, nos canos, nas ruas, nas sargetas, nos arrebaldes e nas margens do Santa Barbara!”
Na década de 1890, vários eram os inconvenientes desse serviço. A questão mais complicada era o aspecto financeiro. Por ser um serviço pago, a maioria da população preferia abrir buracos nos fundos dos quintais ou jogar seus dejetos nas ruas, exalando mau cheiro e disseminando doenças:
“Uma das medidas cuja adopção mais urgentemente se impõe é a obrigatoriedade do serviço de matérias fecaes, por quanto, elevando-se a cerca de seis mil os fogos existentes no perímetro da cidade, apenas mil e poucos utilisam-se dos cubos da respectiva companhia, havendo, consequentemente, duas terças partes da população que defeccam ou nos quintaes, ao ar livre, ou em sumidouros, o que é ainda mais perigoso, porque constituem focos de infecção miasmática”. (DIÁRIO POPULAR, 21.10.1893)
Em decorrência dos despejos os jornais apontavam para a contaminação do Arroio Santa Bárbara em 1896. Por essa razão, em novembro de 1897, uma concorrência foi aberta para a escolha de uma nova empresa para a remoção das matérias fecais e águas servidas. A proposta vencedora foi a da empresa do Sr. Antonio Leivas Leite.
Muitas situações embaraçosas e acidentes ocorriam na execução do asseio:
“Limpo mesmo foi um serviço feito enfrente ao mercado, lado da rua 15 de Novembro. Tendo por ali aflouxado a roda de um dos carros do Asseio Pelotense, assistio a visinhança á mais cheirosa baldeação de carga que se pode imaginar. A maneira, então, por que se fez a tal baldeação é que foi mesmo delicada...” (A OPINIÃO PÚBLICA, 13.08.1897)
“Bem emfrente á sachristia da Matriz, esteve hontem atolada, talvez meia dúzia de horas, uma carroça do Asseio Pelotense, naturalmente cheia de ... marmelada! Foram precisos quatro ou seis burros para safar o vehiculo, do qual sempre se retirou um pouco da carga! Imaginem como aquella visinhança não ficou cheirosa!” (A OPINIÃO PÚBLICA, 19.04.1898)
Renato disse…
E quando se pensa que pior do que o acima não pode acontecer, vem à memória o do trem da 8 que fazia a linha Olimpo-Rio Grande quando se chocou com um caminhão de cabungo em frente a Escola Técnica de Pelotas... Fica por conta da imaginação de cada um o resultado de tamanho estrago !!!
Renato disse... Em 10/06/2011 Célio Soares no Jornal Agora: O centenário de Gustavo Cramer "Neste sábado, 11 de junho, transcorre o centenário de nascimento de um verdadeiro herói rio-grandino: Gustavo Ernesto de Carvalho Cramer. Nascido nesta data em 1911, Cramer foi atleta do Clube de Regatas Rio Grande, na natação e no remo, e goleiro do SC Rio Grande, do qual seu pai, Gustavo Torres Cramer, foi um dos fundadores. Após atuar em outras funções ainda na juventude, dedicou-se à aviação, sendo brevetado pelo Aeroclube do Rio Grande, onde chegou a instrutor de voo, daí galgando todos os escalões da aviação comercial, tornando-se piloto da famosa Panair do Brasil." Na década de 1940, a Varig resolve suspender seus voos para Rio Grande, obrigando nossos passageiros a embarcar em Pelotas, enfrentando as dificuldades de uma estrada de péssimas condições, ainda sem pavimentação. Ao tomar conhecimento deste fato, Cramer preocupou-se e resolveu fundar uma em
Comércios tradicionais que marcaram a história do Rio Grande Reprodução - Acervo Papareia Na história da Cidade do Rio Grande, várias casas comerciais surgiram e desapareceram, deixando algumas saudades na população, outras ficando por completo no esquecimento. Rememoremos algumas dessas lojas que não mais atuam no Mercado Rio-grandino, pelo ramo de atividade na qual se tornaram referência, embora, naquele tempo, os comércios fossem mais abrangentes e comercializavam uma variedade de produtos. No ramo de calçados, “Casa Rodrigues” esquina das Ruas General Netto e General Bacellar; “Muniz”; “Neno”; “Sagres”, Rua Andradas; “Triunfo”, Rua Duque de Caxias. No ramo da gastronomia, “Bar Círia”, Rua General Bacellar; “Bar Gato Preto” esquina das Ruas Benjamim Constant e República do Líbano, bar de grandes boemias no tempo da seresta; “Bar Ponto Chic esquina das Ruas 24 de Maio e 19 de Fevereiro, juntamente com a primeira Estação Rodoviária “Café Dalila”; “Carneiro das Frutas”, Rua
Comentários
Hoje a população não sabe, nunca ouviu falar e nem imagina o que foram os “cabungueiros” ou o que foi um “cabungo”
No fim do Império, no Rio de Janeiro havia os chamado tigres, escravos que carregava baldes e barris cheios de dejetos humano sobre seus ombros, que eram levados e jogados ao mar.
Excrementos de uma corte simplória, fedida e como o povo também mestiça seguida de pequena elite semianalfabeta, bajuladora e também fedida, que obrigavam homens escravizados a carregarem suas porcarias, pois não havia rede de esgoto.
Lembrando que o Rio de Janeiro, quando aqui chegou fugindo da Guerra de Napoleão a família real em 1808 fedia pior que uma carniça. Era um esgoto a céu aberto. Era uma cidade imunda, fedida e pestilenta.
Eram esses homens chamados de tigre, pois as porcarias humanas que escorriam desses recipiente deixavam em seus corpos famélicos listras de fezes, o que o levou a serem comparados a tigres.
Porém ainda no fim dos anos cinquenta, início dos sessenta do Século XX, nas cidades de Pelotas e Rio Grande o serviço continuava a todo vapor, agora feito por homens livres.
Havia nas regiões mais abastadas banheiros com louças ligadas a um esgoto cloacal arcaico que simplesmente levava as fezes humanas sem nenhum tratamento para os rios. Rios de onde sairiam a água de beber.
Nas regiões menos agraciadas, onde morava a esmagadora maioria da população, tanto nas cidades quanto no campo o que se usava era as latrinas.
Entretanto nas latrinas mais modernas, essas junto às cidades em bairros populosos, não havia o célebre e profundo buraco cheio de estrume humano e sim o histórico e valoroso “cabungo”, que na cidade portuária de Rio Grande era chamado de “cubo”.
O cabungo ou cubo era um pequeno barril cônico de madeira de aproximadamente cinquenta centímetros de altura, com a boca de mais ou menos vinte e cinco centímetros, chegando a sua base com trinta e cinco centímetros, que semanalmente era substituído pelo Asseio Público, que os levava em carroças puxadas por cavalos percherons, melhor alimentados que os pobres e desgraçados homens que tal serviço faziam.
Levavam o cheio e deixavam um limpinho, embebido em alcatrão ou óleo bem escuro misturado com um pouco de creolina.
Anos depois em Pelotas essa carroças foram substituídas por caminhões pequenos. Lembro-me de um Ford verde que atendia o fragata.
Tais barris eram feitos em tanoarias especializadas aos milhares para poder suprir a demanda de uma grande população, pois vilas e bairros inteiros eram assim atendidos.
Em Pelotas os chamados cabungueiros, homens que transportavam os cabungos, retirando os cheios de fezes e levando-os para as carroças, que depois de recolherem iam para as margens do canal de São Gonçalo, onde despejavam e lavavam esses barris bem próximo de onde atracava a balsa, no final da Rua Tiradentes que fazia a transposição de raros caminhões e automóveis de um lado para outro do canal, erradamente chamado de rio. Essa balsa era o meio que ligava Pelotas a isolada Rio Grande.
E todo esse trabalho imundo, fedido e altamente contaminante, onde vicejava as doenças era feito sem nenhum equipamento de proteção.
Descalços, mal alimentados, pessimamente remunerados, carregavam as sujeiras de toda uma população, com suas calças e camisas velhas cheias de remendos e de fezes. Cheios de doenças e de vermes que dilaceravam suas vidas, que por esse comprometimento eram velhos e alquebrados aos trinta e poucos anos.
Eram considerados por muitos como sendo a escória da humanidade, pois além das doenças que carregavam em seus corpos famélicos e valetudinários, cheiravam tão mal que as pessoas evitavam até de olhá-los, com medo de pegarem suas doenças e principalmente nojo.
Cabungueiros e seus Cabungos II
Por onde passavam deixavam um rastro de mau cheiro e muitos cabungos, cheios até a boca, muitas vezes deixavam outro rastro nos pátios, por onde eram carregados. Um rastro das porcarias humana que como nenhum outro animal tem as mais fedidas fezes.
E assim mesmo, cheirando pior que qualquer outro animal, tem a extrema veleidade de se dizerem divinos, filho de um deus, com o poder por esse dado de reinar sobre os animais.
- Que hipocrisia.
- Que pretensão.
Pretensão que beira a demência.
Pobres cabungueiros.
Seres explorados vilmente em um trabalho sujo, duro e desumano, mas mesmo assim alguns eram gentis e gracejavam de seu próprio infortúnio.
Infortúnio cruel que os aniquilava. Outros sequer falavam, eram homens amargos, tristes, mas todos tinham o mesmo futuro, o de morrerem jovens ainda, mas de aparência extremamente velha, pálidos ou de um amarelão que dava medo. Vidas carcomidas, cheios de vermes que os corroíam em suas desgraçadas sagas.
Muitas vezes se estava usando a latrina, bem sentado no banquinho de madeira sobre o cabungo, quando de repente um funcionário do Asseio Publico abria a portinha dos fundos da latrina e trocava o valoroso barrilzinho, que era puxado por um ganho de ferro já munido de uma tosca tampa que nada tapava, sem ver quem estava sentado obrando.
Levava-se um enorme susto, mas a obra continuava agora em um cabungo limpinho e cheirando a óleo e creolina.
Prof. Pedro A.C. Teixeira
Texto extraído do livro ainda sem título de minha autoria sobre minhas memórias que pretendo em breve editá-lo. (data:2012)
Meu falecido pai contava que por volta de 1945, quando moravam na Rheingantz, em frente ao hoje Hospital de Cardiologia, ali era eram um campo por onde as pessoas passavam para ir trabalhar na fábrica. Como a grana era curta naquela época, igual aos dias de hoje, os mais afoitos cobravam uma pequena taxa de quem enchia seus cabungos antes do tempo e faziam o especial favor aos moradores de se livrarem de duas fétidas caixas. No campo que ligava a Av. Primeiro de Maio à Av. Rheingantz havia uma trilha de areia por onde passavam os operários em meio do capinzal. À noite, eles se reuniam, abriam buracos, despejavam as cheirosas caixinhas e tapavam com uma espécie de rede feita do matagal e areia. Pela manhã ficavam na espera para ver quem caia no buraco. Ora eram homens, ora mulheres que, geralmente vinham duas ou três de braços dados e caiam juntas naquela massa fedida.
SATURNINO DE BRITO
Tem razão Arlindo e a nossa casa, Caramuru quase esquina de Bento Gonçalves, logo na outra quadra da do Arlindo e onde morei por mais de 15 anos, em 2002 e na mesma quadra, algumas casas ainda não contavam com esgoto e se socorriam de fossas e que eram construídas junto a um filtro anterior. Em um retorno por lá e pelo Google Street noto agora o "bolachão" existente na frente das casas, na calçada e próximo ao meio fio e que acredito seja da Corsan.
Em Rio Grande os estudos iniciaram a partir de 1909 sendo que em 1917 sob o comando do Prefeito Juvenal Miller encomenda ao renomado engenheiro sanitarista Saturnino de Brito o início das obras de rede de esgotos a qual deu por encerrada a base em zona central da cidade em 1922.
Saturnino de Brito, brilhante engenheiro reconhecido tanto na Europa como nos Estados Unidos e eleito Patrono da Engenharia Sanitária Brasileira foi agraciado em 1926 com a Legião de Honra na qualidade de 'savant et ami de la France'.
Nome de rua em nossa cidade, Saturnino de Brito (Francisco Saturnino Rodrigues de Brito) faleceu lá mesmo em Pelotas em 1929 enquanto administrava projeto semelhante ao que fizera em Rio Grande.
Enquanto difícil encontrar relatos em nossa cidade, uma pesquisa na vizinha cidade de Pelotas e encontram-se estas 'relíquias':
“É exactamente ao meio dia, quando o calor se torna mais intenso, que os vehiculos da limpeza transitam pelas ruas da cidade fazendo a população supportar cheiros enauseabundos que alteram a saúde e tornam-se assas incommodativos”. (CORREIO MERCANTIL, 27.04.1876)
De 1884 a 1886 a taxa média anual de mortalidade foi de 26,6 para cada mil pessoas em decorrência principalmente de doenças relacionadas à falta de higiene. Em 1890, os jornais sugeriram que os serviços se tornassem obrigatórios, pois, dos 4.200 prédios existentes na cidade, apenas 1.000 eram assinantes do asseio. A imprensa afirmou: “
É claro, pois, que 3.200 casas que o não são, fazem os despejos nos quintaes, nos sumidouros, nos canos, nas ruas, nas sargetas, nos arrebaldes e nas margens do Santa Barbara!”
Na década de 1890, vários eram os inconvenientes desse serviço. A questão mais complicada era o aspecto financeiro. Por ser um serviço pago, a maioria da população preferia abrir buracos nos fundos dos quintais ou jogar seus dejetos nas ruas, exalando mau cheiro e disseminando doenças:
“Uma das medidas cuja adopção mais urgentemente se impõe é a obrigatoriedade do serviço de matérias fecaes, por quanto, elevando-se a cerca de seis mil os fogos existentes no perímetro da cidade, apenas mil e poucos utilisam-se dos cubos da respectiva companhia, havendo, consequentemente, duas terças partes da população que defeccam ou nos quintaes, ao ar livre, ou em sumidouros, o que é ainda mais perigoso, porque constituem focos de infecção miasmática”. (DIÁRIO POPULAR, 21.10.1893)
Em decorrência dos despejos os jornais apontavam para a contaminação do Arroio Santa Bárbara em 1896. Por essa razão, em novembro de 1897, uma concorrência foi aberta para a escolha de uma nova empresa para a remoção das matérias fecais e águas servidas. A proposta vencedora foi a da empresa do Sr. Antonio Leivas Leite.
Muitas situações embaraçosas e acidentes ocorriam na execução do asseio:
“Limpo mesmo foi um serviço feito enfrente ao mercado, lado da rua 15 de Novembro. Tendo por ali aflouxado a roda de um dos carros do Asseio Pelotense, assistio a visinhança á mais cheirosa baldeação de carga que se pode imaginar. A maneira, então, por que se fez a tal baldeação é que foi mesmo delicada...” (A OPINIÃO PÚBLICA, 13.08.1897)
“Bem emfrente á sachristia da Matriz, esteve hontem atolada, talvez meia dúzia de horas, uma carroça do Asseio Pelotense, naturalmente cheia de ... marmelada! Foram precisos quatro ou seis burros para safar o vehiculo, do qual sempre se retirou um pouco da carga! Imaginem como aquella visinhança não ficou cheirosa!” (A OPINIÃO PÚBLICA, 19.04.1898)
E quando se pensa que pior do que o acima não pode acontecer, vem à memória o do trem da 8 que fazia a linha Olimpo-Rio Grande quando se chocou com um caminhão de cabungo em frente a Escola Técnica de Pelotas... Fica por conta da imaginação de cada um o resultado de tamanho estrago !!!